Magazine Luiza: o segredo da empresa que subiu 15.467% na bolsa

Noventa e seis centavos. O valor da ação do Magazine Luiza em 14 de dezembro de 2015 fazia parecer que a varejista jamais retomaria as rédeas de seus negócios ou poria um sorriso nos rostos de seus acionistas. Quase 32 meses e muitos resultados positivos depois, a mesma ação valia R$ 140,03 no fechamento de mercado desta quarta-feira (8). A máxima histórica foi na terça-feira, R$ 148,49 – uma alta de 15.467% na comparação com os R$ 0,96, ante cerca de 80% do Ibovespa e 30,88% do CDI -, resultado de um trabalho minucioso de adaptação à nova realidade do mercado.

A mais longa crise econômica que já assolou o Brasil não é explicação suficiente para demonstrar os motivos da chegada ao “fundo do poço” neste caso – se fosse, a subida do Magalu teria sido comparável à dos demais papéis de seu setor. O problema da empresa era maior, e, bem como a posterior resolução, remete a anos antes.

Em abril de 2011, quando abriu capital na bolsa, o Magazine usou os recursos levantados com a venda dos papéis para aumentar a robustez de seu negócio - já em julho do mesmo ano, adquiriu a rede Baú da Felicidade, por exemplo. Este foi o início de um período de tomada de crédito e expansão, fomentado pelo juro baixo de empréstimos e por incentivos fiscais - principalmente o IPI especial para eletrodomésticos da chamada linha branca entre 2011 e 2014. Naquele momento, o endividamento pela expansão parecia fazer todo o sentido para a empresa.

A partir de 2014, porém, a taxa básica de juros (Selic) já estava em dois dígitos (10,4% ao ano) – e o crédito tomado nos anos anteriores não parecia tão barato assim. No momento mais cruel para a ação da companhia, a Selic estava em 14,15%, valor mais alto da série histórica. Ao mesmo tempo, claro, vieram a crise, o desemprego, a queda no poder de compra, e consequentemente na demanda pelos produtos do Magalu. As vendas de móveis e eletrodomésticos tiveram a queda mais expressiva de todo o segmento de varejo no primeiro semestre de 2015: -14%.

Escalada

Enquanto a dívida crescia e as ações despencavam, o que o mercado não via era a profunda reestruturação que o Magazine vinha realizando para garantir não apenas uma retomada pontual, mas um crescimento sustentável no médio e longo prazo. A mudança primordial foi na diretoria.

Nesta época, mais especificamente na virada de 2015 para 2016, Frederico Trajano passa a acumular os papéis de Diretor Executivo (CEO) e presidente do grupo, aumentando seu nível de influência nos negócios da empresa. Isso foi essencial para a mudança de mentalidade da Lu, que já era uma “senhora” de 58 anos, tanto na idade como nos métodos de negócios.

Junto ao primogênito de Luiza Helena Trajano veio um banho de inovação. As mais imediatas atitudes da gestão foram no sentido de enxugar gastos desnecessários: de cara, cortou viagens de avião na classe executiva e renegociou contratos de centenas de lojas, além de estabelecer acordos com o sindicato dos comerciários e cortar até mesmo o excesso de gastos com energia elétrica. Mas o grande insight de “Fred” não foi em otimizações pontuais, e sim na mudança do “coração” do negócio, que já estava em tímida construção desde muitos anos antes.  

O Digital

Diferentemente da mãe, Fred iniciou sua carreira já com foco em operações digitais. Ele entrou na empresa oficialmente em 2000, com a missão de conceber o primeiro site da varejista. Em 2004, passou a ser diretor de vendas de lojas físicas, internet e marketing. Ainda antes de chegar a CEO, assumiu a área de tecnologia da empresa, paralelamente à de logística. Conforme mostram os resultados recentes, a mentalidade online foi essencial para que a empresa chegasse onde está hoje.

Já em 2016, o executivo usava um termo que tornou-se onipresente em todos os relatórios que falam sobre varejo mundialmente: omni-channel. Em entrevista à Forbes pouco depois que assumiu como CEO, ele afirmou categoricamente acreditar que o Magazine era a única operação no Brasil e uma das poucas no mundo a realmente se enquadrar neste conceito, que definiu como “empresa dona de vários canais de venda que usam todos a mesma infraestrutura – mesmos centros de distribuição, mesma contabilidade, mesmo marketing”. Ele acrescentou, ainda, que nenhum e-commerce no Brasil era lucrativo, além do próprio Magazine.</p><p>O mercado parece concordar com o executivo. No primeiro semestre deste ano, um relatório do Credit Suisse classificou o Magazine como uma das 7 empresas capazes de sobreviver ao Apocalipse do Varejo mundialmente, graças à soma de operação fortemente eletrônica e preços competitivos: o e-commerce já passou de 30% das vendas totais da empresa.

Para garantir o sucesso dessa transformação digital, foi extremamente relevante o fato de que, de acordo com os funcionários da empresa, a mentalidade digital tinha fim em si mesma, e não na satisfação dos acionistas. Em entrevista ao InfoMoney no fim de 2017, o atual CTO André Fatala disse que não era cobrado pelo resultado da empresa na bolsa: sua missão sempre foi pura e simplesmente a de fazer funcionar a operação digital da empresa de maneira sustentável e duradoura.

Responsável desde 2011 pelo Luiza Labs, laboratório de inovação do Magazine, Fatala é considerado um dos principais responsáveis pela enorme transformação da empresa. Dentro deste laboratório, o Magazine criou as soluções mais elogiadas dos últimos dois anos como responsáveis pelo seu salto em meio ao competitivo varejo brasileiro – dentre elas, o aclamado marketplace, um app que já tem 16 milhões de downloads e as soluções de experiência do usuário.

A cada ano, a equipe do Labs entrega cerca de 30 projetos estratégicos para a empresa. Esse número é possível graças à altíssima especialização da equipe e à mentalidade de “negócio em construção”: ideias são sempre bem vindas, independentemente do nível hierárquico do funcionário, e o erro não é pecado - desde que usado como forma de garantir aprendizado.  

Pouco a pouco, o mercado começou a perceber a relevância desse esforço. No início de 2018, o gestor Henrique Bredda, da Alaska Asset, um dos maiores acionistas individuais da empresa, falou com o InfoMoney sobre a importância do DNA de inovação da companhia. "Quando conhecemos o LuizaLabs [frente de tecnologia do Magazine] pela primeira vez, em 2015, nos chamou a atenção o seguinte: se a empresa está dando autonomia e espaço pra um cara como o André Fatala, totalmente diferente da cultura de varejo que a gente conhece, é porque de fato entendeu a importância da inovação e tecnologia para o mercado", disse, na época.

O Resultado e o Futuro

Com tudo isto, a empresa foi reconhecida em 2017 como uma das mais inovadoras da América Latina pela revista Fast Company. Na bolsa brasileira, foi a ação mais valorizada tanto em 2016 como em 2017.

Nos últimos doze meses, a empresa reverteu uma dívida líquida de R$ 300 milhões de reais para uma posição de caixa líquido de R$ 1,6 bilhão de reais. No balanço mais recente, o Magalu divulgou o maior crescimento nos últimos 5 anos, tanto no varejo físico como no e-commerce. As vendas totais de R$ 4,6 bilhões, crescimento trimestral de 43,3% e anual de 94%. Liderado pelo marketplace, o e-commerce aumentou nada menos que 66%, atingindo vendas de R$ 1,5 bilhão – ou 33% das vendas totais. O resultado supera, e muito, a média do mercado: segundo dados do E-bit, o comércio eletrônico brasileiro cresceu 13,2% entre abril e junho deste ano.

Agora, há um trabalho novamente sendo feito em expansão. Desde o início deste ano, 30 lojas físicas foram inauguradas. Em maio, a empresa começou a operar na região metropolitana de Maranhão e, em junho, abriu suas primeiras lojas em Goiânia. Mas lojas físicas não podem ser ultrapassadas: ao longo deste ano, as lojas físicas estão sendo transformadas em pequenos centros de distribuição, “que servem todas as plataformas de venda e oferecem novas opções de serviço aos clientes Magalu - a retirada de produtos comprados online, por exemplo”, disse a empresa em comunicado.

No ano passado, a empresa adquiriu a startup Integra Commerce, especializada em gestão e integração entre lojistas e marketplace. Já neste ano, anunciou a aquisição da startup de logística Logbee, o que contribuiu de forma decisiva para a expansão do sistema de Entrega Expressa (produtos na casa do cliente em até dois dias úteis), altamente elogiado pelo mercado. No segundo trimestre, 100 cidades passaram a contar com esse serviço e a participação dele no total de entregas feitas pelo Magalu cresceu 10 vezes.

Mais interessante que isto é o que vem sendo feito no Luiza Labs. O laboratório lançou recentemente um modelo de precificação dinâmica para o e-commerce, além de um piloto de aplicação de Inteligência Artificial para a predição de demanda para lojas e centros de distribuição. Desta forma, a empresa pretende não perder dinheiro com estoque parado.

Mesmo assim, é razoável esperar um desempenho mais modesto para o Magalu a partir de agora. No comunicado de divulgação dos resultados do trimestre, o CEO pincelou uma dose de realismo.  "Os resultados recentes representam um enorme desafio para a liderança da companhia -- sobretudo num cenário de Brasil que continua a exigir uma dose de cautela", disse Fred. Isso talvez ajude a explicar por que a a ação já caiu 5,7% entre a máxima de terça-feira e o fechamento de quarta-feira (de R$ 148,39 e R$ 140,03).

Fonte: https://www.infomoney.com.br/magazineluiza/noticia/7557122/magazine-luiza-segredo-empresa-que-subiu-467-bolsa




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